quinta-feira, 27 de agosto de 2020

LAGARTIXAS

 

DA MINHA JANELA VEJO … VIRGÍNIA DE SÁ



LAGARTIXAS


Quando escolhi a casa tudo era verde. Verde selvagem, desenfreado, desordenado, lagartixas que corriam por todo o lado. De brincadeira, pensei até colocar uma placa com os dizeres “Quinta das Lagartixas”, mas depois pensei que seria uma placa enganadora. Com os seus 400m2, não chega a ser uma quinta.

No primeiro ano chorei. Não me conseguia habituar a estes muros prisão, sem vistas para a cidade, o trânsito, o supermercado em frente, o Banco por baixo, uma esplanada com sombra nas traseiras e outra com sol na entrada da frente. No meu apartamento de Carnaxide, em Oeiras, tinha grandes janelas com portadas, varandas enormes e uma vista de 4º andar desafogada e agradável. Ali nunca haveria monotonia.

Depois habituei-me às lagartixas a correrem e a apanharem sol. Veio o cão, que ofereci ao Santiago como prenda dos seus 59 anos, ao fim de um mês a vivermos na casa. Mais tarde morreu a gatinha Morgana, com vinte anos, em Janeiro de 2020. No inicio de Abril do mesmo ano, apaixonei-me pelo Yoshi, um gatinho de oito meses, que vi numa foto de uma Associação em Coimbra, para adoção. No dia 8 de Abril, em pleno Covid, adoptámo-lo e renasceu a nossa alegria. Os bichos amam-se, brincam e correm pela casa, abraçam-se. Dormem juntos às sestas e fazem-nos felizes. Acho que aprendemos a ser felizes com eles e as coisas simples da vida.

A janela contempla agora as mudanças de estações. Uma coisa que nem tinha percebido verdadeiramente que existia, porque nem tinha tempo. Os verdes, que se tornam vermelhos e castanhos e amarelos e laranjas, as folhas que caiem, os ventos que sopram a geada que queima. As temperaturas de menos de 5º pelas noites de inverno, e de mais de 40º nas tardes de verão. E a primavera com as abelhas, as borboletas, as formigas e as lagartixas com a cauda no ar, a correr, perseguidas pelo Faísca. E a cada estação renasço …